Análise: O discurso de Charles, a diplomacia britânica e o “relacionamento especial” com Trump

Sep 17, 2025By Gilson Pimentel
Gilson Pimentel

O banquete oferecido ao presidente Donald Trump, em Londres, não foi apenas um ato protocolar. O discurso do Rei Charles, ao enfatizar o “vínculo duradouro” e a “confiança inabalável” entre os Estados Unidos e o Reino Unido, deve ser lido como parte de uma estratégia diplomática que ultrapassa a cortesia real.


Desde a Segunda Guerra Mundial, britânicos e norte-americanos cultivam o chamado “relacionamento especial” — uma aliança estratégica que sustenta o equilíbrio de poder no Ocidente. Em tempos de instabilidade global, marcada pela guerra na Ucrânia, pelo avanço de novas potências e pela crescente polarização política interna nos dois países, o gesto de Charles ganha peso político.

Ao mencionar explicitamente a Ucrânia e elogiar o “compromisso de Trump em encontrar soluções para conflitos intratáveis”, o rei buscou projetar uma imagem de cooperação e pragmatismo. Porém, há uma leitura implícita: trata-se também de um sinal de que Londres aposta em manter influência junto a Washington, independentemente de quem ocupe a Casa Branca.


Outro ponto relevante foi a referência às questões ambientais — tema caro a Charles, mas que contrasta com a postura histórica de ceticismo climático de Trump. Ao incluí-lo no discurso, o monarca pareceu equilibrar diplomacia com convicções pessoais, inserindo a pauta ambiental num espaço dominado por segurança e geopolítica.

Do ponto de vista político, o banquete mostrou que a monarquia britânica continua a ser utilizada como um instrumento de soft power, capaz de reforçar laços diplomáticos sem entrar diretamente na arena partidária. Ainda assim, ao elogiar Trump em um momento de forte contestação interna nos EUA, Charles envia uma mensagem de pragmatismo: para o Reino Unido, a relação com Washington é demasiado vital para ser colocada em risco por divergências políticas.

Em suma, o discurso funcionou como um ato de equilíbrio: reafirmar a amizade histórica, manter espaço de diálogo em temas delicados e mostrar que, diante de um mundo fragmentado, Londres ainda aposta na aliança transatlântica como pilar da sua estratégia global.